domingo, 21 de outubro de 2007

Império dos Sonhos (INLAND EMPIRE)

O pulsante absurdo que nos invade enquanto testemunhamos o novo filme de David Lynch, “Império dos sonhos, nos leva a repensar os diversos tipos de reações que o cinema tem a capacidade de provocar. Se imagine lendo poemas de um mendigo esquizofrênico de trás pra frente, ao mesmo tempo em que pula de para quedas sem enxergar o chão.. Pensou?! Pois é...

Lynch é um velho escroto e genial, que insiste em dar imagens ao imprevisível mundo da subconsciência. Império dos Sonhos é um filme intrigante antes, durante e principalmente depois, nos envolve em um lento processo para pensá-lo, digeri-lo. É uma experiência travestida de cinema onde o desespero, dor e beleza nos entorpece sem piedade.

Durante a projeção ia bolando teorias, fazendo diversas ligações, buscando desconstruir o tal império, mas aí que vinha ele e me dava uma rasteira, e outra, e mais outra, e assim de tanto apanhar fui levado a achar que o tal velho cineasta tavasacaneando, tocando o “foda-se” pra tudo mundo sofrer, e que sua genialidade tinha atingido um estágio sádico da relação filme-espectador... O achei irresponsável e egoísta por me jogar num mundo incompreensível, que provavelmente nem ele talvez quisesse dar algum tipo de coesão. Fui aos poucos percebendo que não há no filme nenhum exercício de autoridade cinematográfica, muito pelo contrário, há sim um constante diálogo, nos questionando sempre: “Você quer ver?”, ao mesmo tempo que nos convida pra dançarmos como personagens nesse universo, que só faz sentido quando o aceitamos enquanto espaço de questionamento da realidade. Literalmente adentramos na deliciosa angústia que nos aproxima totalmente da protagonista (Laura Dern, fantástica!), no momento em que ela se entrega e compartilha conosco o mesmo desespero: “Eu não sei o que veio antes ou depois. Não consigo distinguir o ontem do amanhã e isso está fodendo com a minha cabeça.” Percebi uma conexão perturbadora com os delírios da personagem, e lado a lado fui me intrigando com seus caminhos, me entregando a libertinagem, à orgia das imagens (que Buñuel e Dali iriam invejar... As seqüências mais surreais da história do cinema recente) que iluminava e escurecia por completo a sala.

Depois da primeira hora de projeção dominada pelo silêncio, a sala entrou em um constante movimento, onde as pessoas falavam, soltavam risadas sem sentido em momentos bizarros, faziam caras e bocas, iam embora... meu incômodo inicial levou a notar o quanto filme se democratizava, dava a cara pra apanhar também, podendo ser mal interpretado, odiado, definido como pseudo-intelectual, porra-louca, assim como também louvado, apreciado, debatido, intensamente relevante.

Esse filme me expandiu, levitou, assustou, ativou um ponto do meu cérebro que se mantinha em coma.. Vida longa as “não-respostas”, a arte que ninguém pode ao certo definir! Aos pesadelos estranhos!

Cinema de interferência, libertação e expansão de idéias, seja ele simples ou Lynch!


por: ramon

7 comentários:

Jeniffer Santos disse...

interessante o txt.
vou procurar o filme para ver x)

beijos e boa semana!

Taiane Dantas disse...

huhu! o seu filhote que custou a sair...
bem, eu não sou muito entededora de cinema não e por falar nisso pretendo aprofundar meu conhecimento a esse respeito.
pelo que eu pude notar o filme é bem perturbador e leva a gente a se confundir bastante, além de intrigar.quero ver! :D
quero ver muuuuitos filmes!


:*

joanarizerio@gmail.com disse...

bravo, ramon!
adorei o seu testemunho. impressionante como você captou, digeriu, sintetizou tudo, desde as reações do público, aquele misto de histeria, os risos nervosos e inexplicaveis... ate arriscar a intenção do diretor. foi bom ter assitido com voce, adorei seu texto, parabens, bj.

eu? disse...

"Se imagine lendo poemas de um mendigo esquizofrênico de trás pra frente, ao mesmo tempo em que pula de para quedas sem enxergar o chão.. Pensou?! Pois é... "

Meniiino, cê teve a mesma sensação que eu! Eu me vi bem assim mesmo, ou lendo um dos textos de um professor meu de Psicopatologia, o que não é muito diferente!
Nos primeiros 60 minutos eu tava tentando entender o filme, depois pensei: "pra que diabos tô tentando entender um filme de Lynch?!". Após isso a reação na sala foi a que vc descreveu, teve uma hora que eu mesma não consegui deixar de rir também. Aí pensei: "se minha cabeça tá fodida, imagine a dessa mulher!". Aí ele veio e soltou aquela parte da confusão temporal, e eu comecei a rir mais ainda, sentindo as mesmas coisas que a Laura. Acho que foi um dos filmes que mais me despertou sentimentos estranhos e contraditórios. Depois que o assisti fiquei uma cara tentando descobrir se era MUITO BOM ou UMA MERDA... agora, acho que posso dizer que o filme é realmente foda.

nai disse...

Lynch, muito bom.

renata disse...

Nossaaa, minha reação foi negativa muito no início do filme;logo na primeira cena. Na qual encontramos
um casebre simples e três pessoas com "cabecinhas" de burro,jegue,jumento...Isso poderia ser entendido como ignorância ou intolerância da minha parte, talvez. A verdade é que não gostei, mas tenho que confessar que a atitude do público foi totalmente questionável,curiosa e diversa.E depois que desisti do filme,mudei meu foco para as reações deste e notei exatamente isso que descreveram.Até que passei mal,eu digo,psicologicamente e saí da sala faltando 30' pra finalizar a sessão.É isso.E viva o exagero e as reticências.Grande abraço!

PS. Eu assisti na mesma sessão que você Ramon,acho que posso lembrar e cheguei até aqui.

lekineka disse...

como você já tinha feito seu depoimento a mim pessoalmente, só pude comprovar com o texto. n assisti ao filme mas fiquei intrigada. e eu gosto de intrigas. deu para notar não?? as nossas conversas ainda fazem falta.bjos!!