quinta-feira, 29 de abril de 2010

Cage/ Cortázar

Viva, viva o Silêncio!!


Aplastamiento de las gotas

Yo no sé, mira, es terrible cómo llueve. Llueve todo el tiempo, afuera tupido y gris, aquí contra el balcón con goterones cuajados y duros, que hacen plaf y se aplastan como bofetadas uno detrás de otro, qué hastío. Ahora aparece una gotita en lo alto del marco de la ventana; se queda temblequeando contra el cielo que la triza en mil brillos apagados, va creciendo y se tambalea, ya va a caer y no se cae, todavía no se cae. Está prendida con todas las uñas, no quiere caerse y se la ve que se agarra con los dientes, mientras le crece la barriga; ya es una gotaza que cuelga majestuosa, y de pronto zup, ahí va, plaf, deshecha, nada, una viscosidad en el mármol.

Pero las hay que se suicidan y se entregan enseguida, brotan en el marco y ahí mismo se tiran; me parece ver la vibración del salto, sus piernitas desprendiéndose y el grito que las emborracha en esa nada del caer y aniquilarse. Tristes gotas, redondas inocentes gotas. Adiós gotas. Adiós.

juliocortázar

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Sobre dedos e anéis ( Um texto imperdível )

Cuidado, existem coisas que desaparecem! Sim, simplesmente somem sem deixar qualquer pista, restando apenas a amedrontadora sensação de estar à mercê dessa misteriosa força engolidora de matéria. E não adianta buscar maiores estratégias investigativas. Onde foi mesmo que abri minha mochila descuidadosamente pela última vez como se estivesse dopado ou em um transe letárgico? Isso talvez só retarde o processo de desapego que teremos que exercitar sempre, seja com uma caneta-calendário, seja com uma das suas cuecas preferidas, seja com o Salvadorcard... Ah Salvadorcard, esse indispensável objeto que representa toda miserabilidade estudantil, acadêmica, humana soteropolitanamente humana. Sem ele, muitos teriam que escolher entre comer e se locomover, estas tão básicas e primárias necessidades humanas possíveis ali, em um mesmo pedaço de plástico de 8 cm.
Por um tempo temia assaltos que subtraíssem o bendito cartão, ou quem sabe uma colisão do ônibus com uma Kombi 82 justamente enquanto passava na catraca, impulsionando assim o cartão dos meus dedos rapidamente via janela, para nunca mais. Perder era a última possibilidade cogitada... O ostentava desde 2004, o conservava, mesmo encardido, com uma foto tosca, menor, riscada por milhares quilômetros de aventuras urbanas. Um dia desses ele sumiu. Parei na rua com uma fugaz sensação de ausência, não, não era fome... vasculhei-me, a mochila. Voltei, refiz os passos olhando pro chão fétido de uma ordinária noite de terça-feira com os olhos cada vez maiores, cada vez menos discretos, desconsertados, sendo aos poucos tomados por um tom de escuridão que só a lamentável necessidade de aceitar fatos inconvenientes podem conceder. Ele tinha ido, e mesmo depois desses quase seis anos de companheirismo não me deixou nem um adeus, ou melhor, que se perdesse com um pouco mais de emoção, pra que pelo menos eu pudesse contar aos risos em uma roda de amigos que sabem rir das próprias pequenas desgraças. Bloqueio, agendamento, pagamento. O processo é lento, dura neurônios e dias de paciência, enquanto a cada saída, a cada ônibus, a humilhante entrada no coletivo sem encostar o cartão naquela maquininha (bip), juntando os trocados, miúdos e moedas pra pagar o cobrador. O dia da forja da segunda via chega e em pouco mais de duas horas uma nova foto, agora maior e estranhamente comprida estampa um novo cartão, que por uns instantes até nos convence de que foi até melhor ter feito outro. Duas semanas depois, de novo! Cadê?? Tava aqui!! Mais uma vez o mesmo vácuo satânico o captura, agora de forma ainda mais sorrateira, absurda, angustiante, revoltante, sem graça nenhuma. Impossível! Palavrões gritados internamente contrastam com uma externa feição tipo Forrest-Gump. O mesmo foi com o celular. Tinha um aparelho que já quase em processo de tombamento como patrimônio material foi trocado por um modelo novo, contendo todas as teclas, sons, cores. Um mês e meio depois: sumiu Brasil! ( ) Atônito, pensei nos tantos outros absurdos que nos cercam, e como aqueles sumiços eram apenas uma amostra grátis do quanto você não sabe absolutamente nada a respeito do inexplicável. Senti um vazio existencial, não por ter perdido uma coisa, mas por vislumbrar minimamente o descontrole do mundo em escala menor, desmanchando a ilusão de segurança na qual aprendemos a se envolver. Nessa profusão de pensamentos bandidos, por dois segundos, senti como se uma grande parcela do meu todo fosse feitas de equívocos... eu como descuido de acasos caóticos.
Um, dois.
Depois de algumas analises tenho chegado à conclusão que tenho certa dificuldade em lidar com novos (ou bastante velhos) objetos cotidianos, como se minha mochila os expelisse, se achando um minúsculo museu ambulante de simples pertences, que pode julgar o que fica, o que vai. Talvez seja uma revolta instintiva, animal, de auto sabotagem, revoltada contra essas burocracias que nos dizem como e pra onde ir.
Ou será que toda
essa tola dramaticidade nos surge quando não temos muito como explicar vacilos próprios?! Pensando bem, perder coisas até que ajuda a nos manter num certo eixo (o que não se aplica mais ao salvadorcard, claro), nos reconectando as falibilidades, mais através dessas trivialidades, do que com as chatices realmente dolorosas.
Significados, histórias, experiências, como os dedos, são mais difíceis de se descolar.
A conta é simples e acho que o ganho vem sendo maior. Ufa!

(Tinha uma conclusão super construtiva, mas a idéia me fugiu agora).

sábado, 17 de abril de 2010

O paradeiro das folhas mortas

A pessoa que atravessava a rua naquele momento poderia ser a mesma de qualquer momento; poderia simplesmente ser a mesma que acenaria na solidão dos gestos e dos princípios. Assim, como em outras vezes , quando desenhando com os dedos um objeto desconhecido, poderia ter premeditado tudo naquele instante, seria assim que essa estória poderia acabar: poderia te olhar e relatar tão somente seu princípio e seus gestos. Longe de tudo, seu olhar acabaria diante daquele cinza que sua roupa me fazia recordar de um buquê de flores em preto e branco. Sem que pudesse contar da minha vida ou de como o cheiro de outubro restava ainda em sua própria feição, ninguém saberia do seu corpo. Naquela noite, mais do que uma mentira contada no mais absoluto silêncio, eu te abraçaria e seria como se seu corpo nunca fosse tomado pelo silêncio das folhas mortas. Nunca ninguém saberia dos seus passos e dos destinos de nossas vidas. Como se ninguém existisse, seria apenas aquele gesto. Ninguém saberia de você nem dos caminhos das folhas mortas; Por mais uma vez, poderia ter repetido tudo que lhe havia dito. Diante do silêncio de mais um dia ,sem mencionar seu nome, a chuva então nos separaria em todo o seu silêncio: “Há quanto tempo chovia?” Queria te observar por mais um instante, e poderia te chamar como sempre te chamei: “há quanto tempo te olhava?” perguntei. Contudo, queria ter lhe dito das folhas mortas , quando antes te abracei. Poderia ter lhe dito: “Olhe para as folhas...” lembro de você sorrindo. Era como se nunca tivesse lhe dito das folhas mortas, das folhas desse outubro afundado.
Por: Francisco Gabriel

sábado, 10 de abril de 2010

conversa sem sol

- Você tava falando sobre uma idéia que surgiu assim meio do nada...
- A é... Queria escrever um conto, um conto alegre, sobre pessoas que ficavam rindo das lembranças na frente de uma casa, em um fim de tarde qualquer. Descrever lentamente como a cor do muro combinava com o tom das vozes, de como o vento atingia seus lábios como se fosse sua única função e desejo. Me parecia mesmo uma imagem contagiante, simplesmente. Algumas pessoas, quase como cantando, alto, rindo de si... Rindo de serem quem são, mas que eu não sei, apenas que sentadas ali na escada perto da porta celebravam, como em um ritual.
- Hum, bonito. E de onde foi que veio isso?
- Surgiu, de algum modo como se de uma lembrança perdida sabe. Uma viagem, se ergueu entre pensamentos confusos, ai cresceu. Sei também que havia uma senhora de cabelos e rugas brancas que pra falar sempre balançava suas braços, só abaixando quando a gargalhada lhe tirava maiores forças, batendo a palma da mão sobre a coxa. Isso me emocionou de um modo estranho. Como organizar uma imagem dessas assim em palavras?
- E pra que organizar? Tem coisas que não podem ficar simplesmente largadas, elas tem que sair de algum jeito... Sabe aquela letra que o Lobão fala sobre o Caetano?! Ele diz mais ou menos chega de verdades, viva alguns enganos... Gosto disso, acho que ele tenta dizer isso sabe. Viver enganos, temer menos, sei lá.
- É, normalmente o que eu gosto assim de primeira sai com essa dificuldade, ou nem sai. E o que parece besta se vai que eu nem percebo, e já está em algum papel rabiscado... Depois aí vou tentando melhorar e tal.
- Ou seja, num primeiro momento a idéia tem que parecer ruim... A prática acaba tragando mesmo aquilo que parece menos pretensioso.
- É, uma lógica engraçada né. Essa dificuldade... Tem um documentário do Chris Marker, eu nunca me lembro do nome, começa com uma imagem que o cara considerava a representação maior da felicidade, e que por isso parecia não funcionar com mais nenhuma. A montagem iria...
- Mas o cara fez o filme né?!
- Fez, e eu gosto pra caralho.
- Então... Você já tem uma boa referência, e justamente...
- Pô, já passa das três.
- Tem que acordar cedo amanhã?
- É, acho que vou correr, pra ver se as soluções de idéias correm atrás de mim. Muitas delas me surgiram assim, quando corro.
- É uma boa. Exercita as duas coisas, tem gente que vai pro analista.
- Acho que foi um sonho.
- Sonho?
- Essa coisa das pessoas rindo na frente de uma casa...
- Pois é, sonhos são as coisas mais desorganzidas que existem, e uma das melhores. Lembre aí o nome desse filme.
- Amanhã quando tiver correndo eu lembro.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Por um cinema de alteridade

Enquanto todo mundo fala da ansiedade de ver a versão burtiniana de "Alice no país das maravilhas", fico dificultando com outras cinematográficas questões: o que implica hoje fazer cinema na América Latina? Há um Cinema Latino-americano sendo produzido de maneira integrada como nos anos 60 e 70? Quando será que esse cinema provocará tamanha ansiedade no público? Ansiedade tipo essa por Alice... Nada contra o Tim, até tenho certa simpatia por alguns filmes dele, mas é inquietante, como sempre foi, sentir a impossibilidade de maiores alternativas na hora de pensar esse cinema como meio de questionamentos, visibilidades, integrações... ah e de diversão também, claro!
Sempre esperamos o mais novo lançamento do antigo remake americano sem ao menos ousarmos encostar nosso nariz em um filme boliviano, cubano, argentino. Questionamentos que vão para além do cinema, mas que perpassa toda uma questão histórica/ política/ social que todo mundo parece já ter ouvido falar por aí, mas que poucos conseguiram assimilar, criticar, atualizar... Onde então estarão nossas novas inquietações e histórias? Provavelmente em Zona Sur ou em La Teta Assustada.
Os Inquilinos, de Sergio Bianchi, talvez. Esses poucos exemplos já nos ajuda a fugir não só de uma hegemônica idéia sobre o cinema, mas também amplia a concepção sobre o atual panorama do cinemalatinoamericano, erguido historicamente como meio de bloquear imperialismos.
O Novo desse cinema atual parece precisar de um S para ilustrar sua riqueza e amplitude, agora desenvolvido primeiro por suas singularidades artísticas e temáticas, mais que por um rótulo, o que hoje acabaria por reduzir maiores capacidades. É justamente por essa diversidade que a circulação desses novos cinemas parecem ainda mais urgentes ao continente. Esses filmes parecem acompanhar complexidades e desafios que a América Latina enfrenta, cada um a seu modo, sem querer diagnosticar ou solucionar problemas. A indispensável eclosão do Cinema Novo (Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Tomas Gutierrez Alea, Fernando Birri, Jorge Sanjinés, Garcia Epinosa, Fernando Solanas) surgiu dentro dessa ânsia por reinterpretar toda uma construção identitária, que agora parece ter desenvolvido suas imagens sem precisar ser tematizada, discursiva, didática. A pungência de O Pântano, filme argentino de Lucrécia Martel, parece um bom exemplo pra essa representação/imagem em simbiose com o discurso.
A capacidade renovada da imagem nos filmes contemporâneos latino-americanos ganham ainda mais sentido quando comparada a mega-filmes como
Avatar, onde a história já mais que conhecida serve quase como pretexto para a produção de efeitos estéticos que ocupem o máximo de tela possível. Essa compulsão pela imagem esvaziada de sentido acaba por nortear a produção americana dos últimos 30 anos, salva por alguns exemplos vindos principalmente das animações e outros bolsões independentes. A própria Academia parece indicar pra um outro sentido dessa crise criativa quando elege com o Oscar um filme como Guerra ao Terror. E O Segredo dos Seus Olhos, quem viu, quem verá? O certo é que apenas nos chegará graças ao brilho da estatueta sobre sua latinidade(?!).
Não há como dar conta mais de conceitos e nomenclaturas como
Retomada do cinema nacional quando há Beto Brant e Daniel Filho lançando filmes num mesmo ano no Brasil... imagine conceituar unicamente todo um periférico cinema do continente?! A ponte de integração desse Cinema Latino Americano parece estar cada vez firmada na sua capacidade de se diferenciar e produzir sentidos múltiplos, em variáveis atmosferas, dialogando e se transformando para além das fronteiras. Outros tempos e olhares que só não mudam na inquietação desses cinemas se adiantarem sobre o nosso interesse.

Proponho então o seguinte exercício de alteridade: antes de ver
Alice, experimentemos Lucrécia!