terça-feira, 10 de novembro de 2009

Sinal fechado

Mesmo que nunca percebêssemos as cenas da Baía ao entardecer, mesmo que todas as cenas seguissem até o último momento, que era a imagem da baía a partir duma janela, Isa observaria a rua; E mesmo que o som do trânsito aumentasse de intensidade, ouviríamos os passos, antes que ela soubesse que o mundo terminaria diante daquele silêncio. Mesmo que o mundo terminasse por aquela tarde esquecida, Isa continuaria a mesma doutras vezes. Quer fosse por esse silêncio duradouro, ninguém saberia que a cidade seguia em tom de azul desbotado: ninguém saberia daquele azul. Por mais que quiséssemos, nunca saberíamos de Isa nem desse dia. E assim, como em tantas vezes, poderíamos ter dito que tudo era somente aquele entardecer. Pela avenida, o semáforo se perdia novamente pelo vermelho. E antes que todos soubessem daquele dia, dos carros bem como do sinal, poderíamos ter dito que a cidade terminaria pelo silêncio afundado de mais um entardecer. Sim, Poderíamos ter dito. Entretanto, não havia nada a ser dito além dos passos apressados das crianças pela praça. Não sem antes a perdermos de vista: já não ouvíamos as buzinas dos carros. Por mais que tudo nos silenciasse, as imagens da Baía correriam como num filme, sem que distinguíssemos qualquer um dos personagens: a janela, as fotos, o espelho e as imagens dos amantes em mais um fim de tarde. Mesmo que a cidade nunca silenciasse, nunca nos esqueceríamos daquela última imagem. Então, novamente, veríamos as fotos pela parede da sala, a imagem de Isa diante do espelho e as imagens dos amantes pela cama. Mesmo que nunca a amássemos, ainda assim, haveria aquela última imagem: os resquícios de mais um dia terminado. Então, por um instante, poderia nunca ter existido nenhuma imagem, nem o corpo de Isa coberto de um negrume parco, como numa tela de cinema escurecida, a espera de que tudo novamente terminasse.

por:
Francisco Gabriel Rego

3 comentários:

subliterato disse...

Li algumas vezes, e cada vez que lia me sentia um personagem diferente, inclusive Isa. bonito texto vei... espaço aberto!

Leo Coutinho disse...

Era as paisagens que ninguém via, as viagens que ninguém fez, os silêncios na melodia.

Era as fotos não reveladas, as ideias que ninguém teve, os personagens em agonia.

Era as luzes opacas do fim do dia.

hebert disse...

chico é um dos grandes