domingo, 1 de agosto de 2010

Esboçando Cuba

À Havana.
por: joao inada

Cuba parou quando nos viu. Ou talvez já estivesse parada, em meados de 1959 de 2010, ereta e vestida de uniforme militar, fedendo a vulgaridade e a pouca moça virgem, e com bastante musica na esquina. Esquinas com cheiro de cubano, cubano de verdade e olha que cubano mesmo não é lá tão cheiroso. Olha esse cheiro. Cheiro de centro urbano quente e tropical bem sujo-carismático; cheiro de gente na rua, de gente suada, de prédios maravilhosos caindo aos pedaços; de malandragem no ritmo de caminhar, cheiro de Compay Segundo fumando puro; mas junto com cheiro de coisa bruta, concreta, cheiro de medo, aquele cheiro que te lembra a ficar de sentinela pra não pagar de otário, porque depois sai caro — especialmente quando tudo é tão caribe. Não sei, pode ser que cheire até a soteropolitano em dia de iemanjá num vagão de trem lotado rumo ao inferno de uma praia ou de uma procissão, mas que pelo contrário está indo trabalhar, se não vai preso; e ainda dizem que Salvador é mais Santiago. Tenho lá minhas dúvidas.
... pode-se que vagando sempre se ouve o gingado das palavras, e tudo soa tão sonoramente despluralizado — um enfeite do ditorredito popular que muito se ouve mas que pouco se entende, graças a deus.
Querendo tente imitar o incompreensível jogo cubano de falar atirando mastigados melódicos, uma porção deles em pedaços de língua pra tudo quanto é lado(essas são as regras): os resultados surpreendem sempre — especialmente se você for vegetariano. Porém entende-se, entende-se sim, apesar de não ser recíproco. As conversas custam a enveredar mas seguem e vão adiante sempre fugindo da ilha, pra’quele mar lá dos EUA.
Pois então atiram-se os aniversários feito metralhadora. Cuidado, vai a dica: cada velha parada numa esquina de La Havana faz aniversário todos os dias, por isso quer que você pague pelo rum da festa ou pelo porco assado, que alias já está no forno. Obviamente sensibilizado com a decadência destes seres matriarcais, e ainda mais pelo convite irrefutável de um gole de rum claro como o dia, despeje o pouco do dinheiro que lhe resta nas mãos amassadas dessas cubanas e tome no cuc.
Mas vale a pena. Até aqueles charutos nojentos comprados a preço de ouro valem a pena. Podem ser uma merda mais são cubanos. Aquele trago de rum que te faz vomitar também vale a pena; reconhecer Maurinho e o diabo no meio da rua — alunos, coitados; uma Ivett cheia de lindeza e malemolência; uma escola perdida no mundo (“isso sim é golfar com dignidade!”); todo comunismo descaracterizado e persistente que vem no pacote de turismo político — é pra mergulhar e sair bêbado mesmo —, e beber a estátua de Hemingway; se perder no museu fechado do José Lezama Lima todos os dias, quentes e ensolarados com um copo de cana. Passear pelas ruas e por aquele cheiro que marca e que não gasta, nem por nada que não gasta nesse mundo. Cheiro de tudo misturado com verdade bem pouca, com solidez e persistência política unilateral, e aquela pitada de sempre: santeria (com um pouco de Roberto Carlos). Dá saudades só de pensar em ser cubano, de pinga.

2 comentários:

subliterato disse...

João escreve como fala.. ou fala como escreve...
criativos, hilários e cinematográficos momentos
compartilhados com a patota do ap 314.
Privilégio encontrar essa gente toda em um lugar
tão marcante e também aqui, através das palavras.

Icaro Mota disse...

Ola rapaz, vejo que já fala de terras caribenhas.... Que buena onda caray! ótimo texto, como sempre ;)... também andei por terras caribenhas Fui a Cancun, Cartagena de indias e outras mais, ainda não fui a Cuba, me convida ai Cabrom! Abraço se cuida se quiser visitar o México e só falar, também a partir de Setembro to em New York, convite feito, vamos jogar um dominó Cubano?! Quantas pedras tem?!