Dizem que há uma média de tempo que parece determinar a produção de um longa-metragem feito na Bahia. A grosso modo são quatro longos anos que separam as gravações até a conclusão da pós-produção. A distribuição é outra história de espera. E quando finalmente estão lá na sala, projetados, quem os vê? Como filmes pagos com dinheiro público não retornam para as pessoas que o pagaram? Como a política que de editais pode dar conta do tripé produção-distribuição-exibição num mercado dominado por um modelo hegemônico e inibidor de nossa própria cinematografia? Questionamentos que se repetem constantemente como bordões tragicômicos. Aceitar essa condição agônica é negligenciar não a arte cinematográfica e seus pilares estéticos, mas o modo como as coisas são reproduzidas e descartáveis a todo tempo, em todo lugar. Precisamos de filmes que nos tirem desse conformismo velho e gasto que nos invade todos os dias quando acordamos. Nos mostraram como Rambo matava russos na sessão da tarde, enquanto nossos personagens se mantinham e continuam invisíveis, bem ao nosso lado, nas calçadas, filas, elevadores, entre as latas de lixo. A TV foi nossa babá e certamente não estamos contentes com essa criação.
Precisamos de mais filmes e menos lamentações. Essa parece ser a única certeza na qual podemos nos apegar claramente. Mas como produzir novos meios diante de situação tão complicada, mesmo pra aqueles já estão tentando realizar cinema há tanto tempo? Como os novos realizadores podem agora se inserir nessa intrincada seara? Nossa responsabilidade parece muito mais séria do que nos damos conta. Em tempos em que as câmeras digitais parecem contribuir para um maior fluxo e diversidade de produções em toda parte, convivemos com uma mordaz contradição, espera e ausência de novas imagens e abordagens. O acesso as novas tecnologias empolgam ao mesmo tempo que nos confundem. Buscamos assimilar toda uma amplitude de vivências e outras experiências para convertê-las em propósitos e ações organizadas, coletivas, que ocupem espaços e nos ampliem para além das nossas salas confortáveis.
Acreditamos que produções independentes realizadas cooperativamente são alternativas eficientes no momento que dilatarmos nossa ideia do que é cinema, para quem e porquê devemos fazê-lo. Hoje formatos, tamanhos e temas não mais parecem encontrar um limite como antes, e a máxima de Glauber de uma câmera na mão e uma ideia na cabeça, ganha ainda mais sentido do que na época que foi proferida. Nossas maiores influencias – mais do que os filmes em si– devem ser outros exemplos de atitude e ocupação, resistência e subversão que emergem a todo momento e lugar.
É urgente termos mais filmes na Bahia agora porque houveram filmes na Itália do pós-guerra, na pós-revolução cubana, porque há “Harry Porter” nos cinemas todos os anos, porque há filmes sendo vistos e feitos na Ceilândia e outras periferias.
Estamos aqui pra assumirmos nossa condição, mas mais que isso, nossa vontade.
Acreditamos que a vivência acadêmica, o aprendizado teórico deve ser uma pequena parte de um processo maior, que com esforço pode realmente nos aproximar, acolher, transformar. Extrapolar os limites de um rótulo geográfico e redutor de “Cinema baiano” - como uma mera área de atuação - pra assumirmos o fazer de um cinema de agora, urgente e necessário, atento as demandas e lutas que farão das nossas imagens pontos de convergência e transgressão.
“Por meio do cinema, é necessário situar os problemas mais complexos do mundo moderno no nível dos grandes problemas que, ao longo dos séculos, foram objetos da literatura, da música e da pintura. É preciso buscar, buscar sempre de novo, o caminho, o veio ao longo do qual deve mover-se a arte do cinema."
Se Tarkovsky, de tão longe, há tantas décadas atrás, proferiu essa frase, é porque o cinema de todo e qualquer lugar precisa do mesmo e transcendente impulso.
Coletivo Urgente de Audiovisual
Julho de 2011
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